O filme de Davi Pretto é mais um terror rural no cinema brasileiro contemporâneo. Ao lado de outros filmes como “Bacurau”, “Propriedade”, “Cidade; Campo” e “Enterre Seus Mortos”, o diretor almeja tecer uma crítica social sobre a exploração do trabalho e o colonialismo no Brasil através de uma alegoria vampiresca bastante literal. Olivia Torres interpreta Amanda, a filha de um latifundiário que retorna da França para o Brasil com seu namorado, um jovem francês, e ao chegar em sua casa se depara com o pai doente e uma série de eventos estranhos.
Não tarda para que o filme nos leve até o vilarejo que existe ali por perto, no qual o proprietário não parece ser muito bem-quisto. Nem Amanda. Os trabalhadores que moram por ali parecem pouco entusiasmados com a chegada do casal, todos com marcas estranhas nos pulsos e um comportamento, no mínimo, errático. Passado o estranhamento inicial, Amanda passa a considerar entender melhor o que acontece nesse lugar e se recusa a ir embora - é quando se inicia o seu desejo de sangue.
Embora a premissa seja interessante, falar sobre a exploração do trabalho ao passo que tece diversos comentários raciais e políticos quando dilacera a carne da burguesia e deixa escorrer o sangue, “Continente” cai bastante ao tentar criar uma camada de mistério que não é sólida o suficiente e, por vezes, irá ressoar mais como um comentário bobo que uma crítica pertinente. A literalidade de suas alegorias parece pedir por uma transparência e objetividade narrativas maiores do que o filme está disposto a assumir.
Os personagens são unidimensionais (a menina que vem assumir o lugar do pai nessa posição de colonialismo burguês, os trabalhadores que não aguentam mais o serviço, o namorado que se une à rebelião, nada vai muito além disso), os diálogos expositivos acabam por reforçar ainda mais a superficialidade do seu comentário central, o que é bastante cansativo da metade do filme em diante e a câmera não pensa muito além dos close-ups e planos-detalhes, ambos recursos que tornam difícil uma relação mais complexa com o espaço apresentado, algo que eu acredito que também falta ao filme, enriquecer mais a suposta relação sobrenatural dos personagens com a terra.
Acaba que onde o filme quer chegar é, simplesmente, desinteressante. A semelhança apontada com “Desejo e Obsessão” de Claire Denis é bastante nítida, mas diferente do filme francês, “Continente” parece cair nas armadilhas de não confiar na própria imagem e se ancora em elementos empobrecidos, os quais irão quebrar a atmosfera do seu próprio horror. Parece que algo não encaixa entre o mistério que o filme tenta estabelecer, aonde quer chegar, e a literalidade e unidimensionalidade do tratamento que concede às suas temáticas. Provavelmente um dos filmes que menos gostei de assistir.
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